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Giallos - O Suspense à Italiana

 

Derivados de um cinema puramente estético como Intriga Internacional (1959) ou Psicose (1960), os giallos foram os filmes que sucederam a onda de produção dos faroestes no mercado europeu. Foi um dos gêneros mais populares no início dos anos 70 e marcaram época com sua estilização narrativa, assumido sadismo, erotismo e violência abusada.

Seu ingrediente básico de roteiro era a decifração de um mistério (ou mais simplesmente a descoberta de um assassino) narrada com um máximo de estilização gráfica. O termo giallo (amarelo) designou o cinema de suspense italiano por causa da literatura pulp de suspense que era editada em livros com capas amarelas na Itália.

 

Filmes de suspense – com suas tramas cheias de surpresas e reviravoltas à moda de Psicose – vinham sendo experimentados desde os anos 60 na produção italiana em filmes como Sei Donne Per L´Assassino (1964), Lo Assassino Há Le Mani Pulite (1967) ou Il Dolce Corpo Di Deborah (1969). Foi com L´Ucello Dalle Piume di Cristalo (O Pássaro das Plumas de Cristal, 1969) de Dario Argento que o gênero ganhou um modelo estético ideal, garantiu seu posto nas bilheterias e inaugurou uma série de títulos extravagantes. Argento praticamente recorreu aos fundamentos do gênero thriller e deu atenção principal aos aspectos técnicos da produção cinematográfica. O modo de narrar era mais importante do que a história contada. Dessa forma, ângulos, enquadramentos, montagem e efeitos fotográficos inusitados eram determinantes da proposta estética mais do que direção de atores ou encadeamento lógico da narrativa. Muitos recorreram aos flash-backs para revelações surpresa e alguns, como Il Diavollo Nel Cervello de Sergio Sollima, chegou a utilizar a repetição de sequências cuja verdade se alterava conforme o ponto de vista do narrador (como em Rashomon).

Mario Bava e Claude Chabrol são as referências precursoras no gênero. Bava com Sei Donne Per L´Assassino (1964) e Chabrol com A Double Tour (Quem Matou Leda?, 1959) – além de Psicose – podem ser apontados como precursores das ousadias estéticas e narrativas que Dario Argento e o cinema giallo intensificaram. A estilização era a própria essência do espetáculo e nela estava incluída a trilha sonora. A proposta do gênero que fazia o mundo dos personagens se dilacerar em um pesadelo de ameaça física e psicológica tinha seu correspondente musical nas experiências radicais das trilhas sonoras.

 

Ennio Morricone, amigo de Argento há tempos, ofereceu-se para compor a trilha de

L´Ucello Dalle Piume di Cristalo e mais uma vez (como acontecera nos faroestes) estabeleceu um modelo que seria seguido nos anos seguintes: música climática chegando às fronteiras do abstrato musical para contrastar a belos temas principais, românticos e evocativos. A desorientação sonora proporcionada por esses extremos musicais dava a tonalidade emocional das fitas. Morricone e Argento repetiriam o modelo bem sucedido em Il Gatto a Nove Code (O Gato de Nove Caudas, 1970) e ainda fariam uma terceira parceria com 4 Mosche Nel Velutto Grigio (Quatro Moscas no Veludo Cinza, 1971). As três composições estão disponíveis em diversas edições (originais, expandidas, definitivas etc.), mas uma seleção do selo americano DRG faz uma ótima coletânea dos três filmes resumindo as trilhas ao essencial. O destaque imediato pode ser dado à bela faixa Ninna Nanna in Blue de Il Gatto a Nove Code, que com seu clima de canção de ninar macabra, é praticamente o grande tema definidor da música nos giallos. Em L´Ucello o tema romântico é derivado de bossa nova e 4 Mosche emprega ritmos de rock (o protagonista é um baterista), e tem um dos mais belos temas de Morricone e de todo o gênero: a lentidão onírica de Comme um Madrigale, conduzido por suaves vozes angelicais.

Também como acontecera com os faroestes, Ennio Morricone seria muito requisitado para os giallos e o conceito em acompanhamento musical criado em L´Ucello – tema romântico alternado a abstrações climáticas – seria reutilizado por ele em diversos outros filmes como La Tarantula Del Ventre Nero (1971), Il Diavolo Nel Cervello (O Cérebro do Mal, 1972), Mio Caro Assassino (O Carrasco da Mão Negra, 1972), e La Corta Notte Della Bambola di Vetro (1971) entre vários outros. Alguns dos temas como os de Cosa Avette Fatto a Solange (1972) ou Spasmo (1974) estão entre os mais belos de suas criações.

A produção de Morricone para os filmes de suspense italianos foi tão importante para sua carreira quanto foram os faroestes no sentido buscar inusitadas combinações instrumentais e sonoras. Algumas de suas trilhas no gênero tiveram participação do grupo vanguardista Nuova Consonanza. Alguns resultados, como a transcendência macabra de Un Tranquilo Posto di Campagna (Um Lugar Tranquilo no Campo, 1969), revelam o gênero suspense (e o período) como um dos mais férteis na produção de música desbravadora repleta de experiências vanguardistas. O efeito conseguido no suspense de Elio Petri é notável na economia de meios: a insegurança e a possível leitura mística que tomam conta do filme são subterraneamente induzidas pela música. A ameaça aos personagens pode ser realmente sobrenatural ou apenas o delírio crescente do pintor Leonardo (Franco Nero). A trilha tem uma das melhores atuações da vocalista Edda Dell´Orso na obra de Morricone, mas ao invés da beleza lírica das árias dos westerns, aqui Edda vocaliza modulações fantasmagóricas de grande efeito.

Mas Ennio Morricone não foi o único destaque nas composições para suspense. Seu frequente parceiro (em arranjos e regência nas gravações) Bruno Nicolai, também deixou seu nome na história com um dos principais compositores do gênero. Sua música para Perche Quelle Strane Gocce di Sangue Sul Corpo di Jennifer (1972) é uma das melhores trilhas musicais dos giallos. La Coda Del Scorpione (1971), La Notte Che Evelyn Usci Dalla Tomba (1971) e Tutti Il Colori Del Buio (1972) são outros grandes momentos de Nicolai, compositor também com notável passagem por trilhas policiais e faroestes. Da mesma forma, o prolífico Stelvio Cipriani tem ótimos exemplos nos giallos, como La Polizia Chiede Aiuto (1974) e Una Farfalla Com Le Alle Insanguinati (1972) no qual adaptou trechos do Concerto Nº 1 para Piano de Tchaikovsky para o formato pop. O essencial Torso (1973) teve trilha inventiva dos irmãos Guido & Maurizio De Angelis. 

Também importante foi o trabalho de Nora Orlandi para Lo Strano Vizio Della Signora Wardh (1971), filme dirigido por Sergio Martino e um dos fundadores das convenções giallo no cinema. Nora foi uma das poucas mulheres a compor para filmes e teve uma interessante carreira em suspense, filmes eróticos e até faroestes.

Reconhecido como o maior nome do jazz italiano, o pianista, compositor e maestro Giorgio Gaslini é frequentemente lembrado pela colaboração com Michelangelo Antonioni no filme La Notte (A Noite, 1961). Mas sua carreira no cinema orientou-se ao cinema popular e diversos filmes de suspense e horror como Profondo Rosso (Prelúdio Para Matar, 1975), La Notte Del Diavolo (1972) e Omicidio Perfetto a Termine Di Legge (1975), trilhas que merecem citação como criações bastante originais que superaram os habituais clichês genéricos.

 

O período áureo para o giallo foi de 1970 a 1975 e apesar das fórmulas orientadoras terem sido seguidas em incontáveis versões/variações, o gênero produziu muita coisa boa cinematográfica e musicalmente. É bastante interessante constatar que suas trilhas (por mais que houvesse um modelo de sonorização) são suficientemente inventivas em sua ousadia experimental.

Com Profondo Rosso (Preludio Para Matar, 1975) o diretor Dario Argento deu impulso novo ao suspense italiano. A trilha musical com o grupo Goblin faria uma inusitada inclusão de rock. 

 

Giallos 2

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